Prática clínica na Estratégia Saúde da Família: organização e registro


Autor: Marcelo Marcos Piva Demarzo, Cristina Alves de Oliveira e Daniel Almeida Gonçalves


Gestão da Prática Clínica

Considerando que o Médico de Família e Comunidade é um recurso de uma população definida e deve ter sua prática influenciada pela comunidade (princípios 2 e 3), deve ter também habilidade de organizar seu trabalho para lidar com as demandas populacionais.

O Médico de Família vê sua população habitual como uma "população de risco" e organiza sua prática para assegurar que a saúde dos pacientes seja mantida, quer eles venham ou não visitá-lo no consultório, através de ações comunitárias. O Médico de Família pode planejar e avaliar suas ações conhecendo o perfil epidemiológico da área adscrita, por meio de informações extraídas do consolidado do SIAB, de outros sistemas de informação, ou mesmo levantando o perfil de uso dos serviços da UBS, estudando as principais causas de demanda espontânea e avaliando quantas consultas/ano cada usuário tem feito e o perfil de cobertura de exames preventivos. Com essas informações em mãos, pode-se organizar uma agenda que atenda às necessidades da comunidade, estruturar grupos educativos direcionados para as pessoas em maior risco, além de planejar as ações comunitárias.

O Médico de Família é o responsável sanitário da área de abrangência junto ao Conselho Regional de Medicina, sendo, portanto, fundamental o conhecimento do território e dos potenciais riscos a que essa população está submetida. Por exemplo, em uma área endêmica de parasitoses intestinais, é importante estar preparado para lidar com o problema, levando em conta ações não só para o indivíduo, mas também para a comunidade.


Tal organização requer uma habilidade de avaliar novas informações trazidas na reunião de equipe, sua relevância para a prática clínica e a capacidade de criar estratégias comunitárias para a resolução dessas questões. O médico é membro e coordenador de uma equipe. O trabalho em equipe é outra característica particular da prática da medicina de família e comunidade que, infelizmente, não é abordada durante a formação médica convencional. Fazer parte de uma equipe facilita e enriquece o trabalho. Cada profissional tem um campo de conhecimentos que se intercalam, levando uma assistência mais completa ao paciente. Daí advém a importância da participação ativa do Médico de Família e Comunidade nas reuniões de equipe, bem como seu envolvimento no planejamento das atividades coletivas.

Partindo das informações de sua área e equipe, o Médico de Família deve criar uma agenda que contemple as principais necessidades de sua área, respeitando a entrada dos usuários no sistema. Em muitos municípios, a agenda do médico é previamente determinada, geralmente por grupos prioritários (HAS, DM, Crianças e Gestantes), além de contemplar pouco tempo para demanda espontânea. Dessa forma, restringe-se muito o acesso da população, infringindo alguns princípios básicos da APS (primeiro contato e integralidade do cuidado). O médico, juntamente com a equipe, deve ter autonomia de pensar a melhor forma de trabalho para que sejam dadas repostas às necessidades da comunidade.

Além disso, o Médico de Família e a equipe de saúde se veem como parte da rede de prestadores do serviço público à saúde e devem ter habilidade para planejar e implementar políticas públicas que vão melhorar a saúde dos pacientes e das comunidades. Dessa forma, podem conhecer, criar e aplicar instrumentos para a avaliação da eficácia do cuidado prestado à clientela. Igualmente, devem usar a referência para outros especialistas e os recursos da comunidade e dos sistemas de saúde criteriosamente. Cada exame solicitado deve ter uma indicação, pois os recursos na Atenção Primária são escassos, e os encaminhamentos e exames solicitados sem necessidade adiam uma atenção ao usuário que realmente precisa, além do fato de que exames e/ou encaminhamentos desnecessários podem gerar dano para as pessoas. Exames solicitados apenas por "ser de rotina" são exemplo comum da não prática da prevenção quaternária e da falta de responsabilidade com os recursos públicos, considerando as necessidades individuais e coletivas.

Para que seja possível indicar corretamente exames e tratamentos, é importante que o Médico de Família reserve um tempo para a atualização médica, levando em conta as melhores evidências médicas disponíveis. Essa atualização pode ocorrer a distância, por meio de leitura de artigos científicos ou até mesmo da criação de reuniões clínicas entre os técnicos na UBS.

Especialização em Saúde da Família
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