Introdução

Antes de começarmos a nossa apresentação teórica gostaríamos de propor a vocês alunos, um exercício de reflexão que acreditamos ser importante para a compreensão do processo de reações e sentimentos de uma pessoa que tenha sido vítima de violência.

Atualmente no Brasil é raro que alguém não tenha passado por algum tipo de violência, seja esta direta ou indireta. Pedimos que você faça um esforço de relembrar algum desses eventos que você tenha vivenciado. Além da situação, gostaríamos que você tentasse se lembrar das reações e dos sentimentos após o evento.

Você provavelmente vivenciou reações que são comuns a todas as pessoas que passam por um evento traumático.

Logo após passar por uma situação de violência, as pessoas podem ter dificuldades em esquecer o evento, é comum que as cenas vivenciadas fiquem voltando à nossa mente o tempo todo, independente de nossa vontade. Também é comum sentir muita ansiedade, ter dificuldade para dormir nas primeiras noites, sentir-se irritado e nervoso.

Algumas pessoas sentem vontade de contar para todos seus conhecidos sobre o que aconteceu, e outras, ao contrário , tem vontade de se isolar e não contar nada para ninguém. São várias as reações que são comuns e esperadas.

Felizmente, na maior parte dos casos, estas reações vão diminuindo com o passar dos dias, tanto na intensidade do sofrimento como também em sua frequência. Após algumas semanas, quase não nos lembramos tanto do evento, as cenas não mais invadem nossa mente, vamos nos sentindo mais calmos a aos poucos conseguimos retomar nosso funcionamento anterior. Ao mesmo tempo, esta experiência vai sendo integrada em nossa história de vida, conseguimos falar sobre ela de uma forma mais tranquila e aquilo passa a fazer parte de nossa biografia, como tantas outras situações desagradáveis que acontecem em nossas vidas.

É comum também as pessoas fazerem um esforço para dar um sentido ao que ocorreu. Com frases do tipo – “vou começar a me cuidar mais”; “ah, podia ter sido pior, pelo menos não me machuquei”; “não saio mais sozinho de madrugada”; etc. – elas demonstram tentativas de dar um sentido ao trauma e integrá-lo em sua história.

Com uma parcela menor de pessoas, esse processo de elaboração do trauma e de integração na própria biografia não acontece, e são elas que desenvolvem o quadro que caracteriza o Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT). Essas pessoas sentem-se como se suas vidas tivessem parado no momento da vivência de violência e não conseguem voltar a funcionar como antes. Constantemente são invadidas pelas cenas terríveis que passaram, são tomadas por sentimentos de ansiedade, nervosismo, irritação e passam a viver com a certeza de que o trauma vai acontecer novamente. Por isso desenvolvem diversos comportamentos a fim de evitar a repetição do trauma.

São com essas pessoas que nos deparamos no cotidiano dos nossos atendimentos, e por isso propusemos este exercício, pois quando o profissional de saúde consegue acessar em sua história de vida vivências e sentimentos semelhantes às do paciente, ele pode ter uma postura mais empática e acolhedora, o que é um dos aspectos fundamentais do atendimento a vítimas de violência.