Aspectos práticos

Gestão do Processo Clínico Individual e Familiar

Consulta clínica – aspectos gerais

A consulta clínica pode ser considerada como um sistema, envolvendo estrutura, processo e resultados (RAMOS, 2008). Veja:


A estrutura de uma consulta clínica diz respeito: aos elementos arquitetônicos e de mobiliário da unidade; à disposição de cadeiras, mesas e outros dispositivos como o computador dentro do consultório; à organização da sala de espera e do acolhimento; ao modo de chamar os pacientes; aos tempos previstos; às regras de agendamento e marcação de consultas e de renovação de receituários, entre outros (RAMOS, 2008). Pode-se incluir aqui também o suporte para o registro clínico: papéis, formulários de casos novos e evolução clínica; prontuário eletrônico, se houver; outros impressos; etc. Dentro desse aspecto da consulta clínica, o Ministério da Saúde brasileiro disponibiliza um manual que propõe diretrizes para a estrutura adequada mínima de uma Unidade de Saúde da Família.

Os processos envolvidos numa consulta clínica dizem respeito: à comunicação profissional-pessoa; às estratégias de condução da consulta (estruturada versus desorganizada, linear e não linear, grau de diretividade); ao método clínico; aos processos de envolvimento e vínculo; à participação e negociação com a pessoa que está sendo cuidada; aos modelos de registros clínicos; entre outros (RAMOS, 2008).

Os indicadores de resultado envolvidos numa consulta clínica dizem respeito, no ponto de vista da pessoa que está sendo cuidada:

  • à satisfação quanto à atenção prestada;

  • à compreensão das explicações e do plano acordado;

  • à tranquilização e ao alívio do sofrimento;

  • à melhoria da condição de saúde e da qualidade de vida;

  • à adaptação ou superação das incapacidades (RAMOS, 2008).

E do ponto de vista do profissional:

  • à adesão ao tratamento e ao plano proposto;

  • ao controle de variáveis e fatores de risco;

  • à diminuição do número de episódios das condições clínicas agudas;

  • à redução das exacerbações, agudizações ou descompensações das condições crônicas;

  • à evitação de desfechos clínicos indesejados;

  • ao tempo vivido sem incapacidades, entre outros (RAMOS, 2008).

É importante termos consciência, como profissionais de saúde, que apenas podemos ter relativo controle sobre a estrutura e o processo dentro do sistema de uma consulta clínica, pois os resultados não podem ser totalmente garantidos. Assim, os dois primeiros deveriam ser exemplares (RAMOS, 2008).

Ainda no que diz respeito à estrutura, ao processo e aos resultados, podemos afirmar que os princípios 1 e 4 descritos no começo do texto (profissional qualificado e relação profissional-pessoa) exercem papel fundamental na consulta clínica. A atuação do Médico de Família e Comunidade deve ser focada no indivíduo, e não na doença. Deve buscar entender a experiência do paciente sobre a doença e como esta impacta sua vida, realizando uma abordagem compreensiva no manejo da enfermidade e de sua família. Por exemplo, um paciente chega à UBS com queixa de dor no pé, que não o deixa trabalhar. Por ser hipertenso, sua PA é aferida e está muito descontrolada. Sua PA alterada nos chama maior atenção pelos riscos potenciais, mas a real preocupação do paciente é a dor no pé. Atender esse paciente envolve cuidar dos dois problemas, mas com uma ênfase maior, no momento, na dor no pé, por mais que a hipertensão nos pareça mais grave. Aumentamos o vínculo com o paciente, pois ele percebe que foi ouvido, e as chances de que ele nos ouça quando formos falar da hipertensão é maior.

É importante realçar que, durante a consulta clínica na Atenção Primária, problemas e queixas apresentados não são pré-selecionados, como num consultório de especialista, e são frequentemente encontrados num estágio indiferenciado, no que diz respeito à história natural das doenças. Os Médicos de Família e Comunidade devem, portanto, ser habilitados para lidar com a ambiguidade e a incerteza desses sintomas.

Outro aspecto importante a ser levado em consideração é o contexto no qual está inserido o sistema da consulta clínica (RAMOS, 2008). No microcontexto, deve-se ter consciência da influência do perfil social e cultural do profissional e da pessoa que está sendo cuidada; no macrocontexto, a influência da estrutura, organização e regras do sistema e subsistemas de saúde vigentes (no nosso caso, o SUS).

Um aspecto determinante para o processo de cuidado e que advém das consultas é a forma como os encontros com as pessoas são registrados. A consulta clínica cujo registro é baseado em problemas tem se mostrado mais adequada na Atenção Primária e será abordada a seguir.